quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Café Europa: Emissão #60, de 25 de Fevereiro de 2013


1.ª Hora
01. DIVISION S - "Blue Canary" (IT)
02. DIVINE MUZAK - "Teach Me Pain" (ROM)
03. Ô PARADIS- "El Tacto" (ESP)
04. THOMAS NOLA ET SON ORCHESTRE- "Freedom’s Little Baby" (USA)
05. COMANDO SUZIE - "Chicos Austriacos" (ESP)
06. ALLERSEELEN - "Tanszt Die Orange" (AUT)
07. DER BLUTHARSCH AND THE INFINITE CHURCH OF THE LEADING HAND- "Eyes – Like Jewellery" (AUT)
08. KREUZWEG OST – “Stammen" (AUT)
09. KIRLIAN CAMERA - "I’m Not Sorry" (IT)
10. SILVER LADY - "Pop Song” (FR)
11. 7JK - "Boxed In Green" (GB)
12. SIEBEN - "Shake The Tree" (GB)

2.ª Hora
01. LAIBACH - "Take Me To Heaven” (ESL)
02. FIRST HUMAN FERRO - "Old Friend At Dusk" (UKR)
03. MANI DEUM- "Love Like Berlin" (GRE)
04. ROSE ROVINE E AMANTI - "Giorni Di Splendore e Sole” (IT)
05. STORMFÄGEL - "Sinngedichte” (SWE)
06. ROME - "This silver Coil” (LUX)
07. NAEVUS - "Song In Suspension” (GB)
08. LARK BLAMES- "Church" (GB)
09. CULT OF YOUTH- "To Lay With The Wolves" (USA)
10. KING DUDE - "Barbara Anne” (USA)
11. SPLINTERSKIN- " A Horrible Night To Have A Curse” (USA)
Laibach
"Iron Sky" no "Fantas" domingo, 3 de Março pelas 23H15

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Café Europa: Emissão #59, de 18 de Fevereiro de 2013

1.ª Hora
01. FIRE + ICE - Long Lankin (GB)
02. FIRE + ICE - "Have You Seen?" (GB)
03. SAGENTOETER - "The Raven's Song" (GER)
04. SEELENTHRON - "Abendgedanken" (GER)
05. STEIN - "Soldatenlied" (GER)
06. Ô PARADIS - "Satoru Nakata" (ESP)
07. VAL DENHAM & Ô PARADIS - "You're Not My Type" (GB-ESP)
08. DERNIÈRE VOLONTÉ - "Invisible" (FR)
09. L'EFFET C'EST MOI - "Distance" (IT)
10. THE DAYS OF THE TRUMPET CALL "Nevoeiro" (GER)
11. ERMO - "Destornado" (PT)
12. THE JOY OF NATURE - "Ainda Há Dias Em que Se Vêem Ilhas Encantadas" (PT)
13. LA CHANSON NOIRE - "Cabaret Portugal" (PT)
14. ROMA AMOR - "Le Coeur Au Chaud" (IT)

2.ª Hora
01. STEELEYE SPAN – “Long Lankin (GB)
02. SANGRE DE MUERDAGO - "Arrastrando As Cadeas" (GAL-ESP)
03. SANGRE DE MUERDAGO - "Cara A Terras Lonxanas" (GAL-ESP)
04. CIRCE - "Der Abschied" (ESP)
05. BLACK TAPE FOR A BLUE GIRL - "You Tangle Within Me" (USA)
06. STIGMATA XXI - "Mars" (BRA)
07. SOLITUDE RAVENCROW - "Magic Of Nature" (GER)
08. KUTNA HORA - "Little Flowers In My Hands" (ARG)
09. SPECTRE - "Meine Ehe (reprise)" (IT)
10. ROSE ROVINI AMANTI - "Soldato Cristiano" (IT)
11. MAJA ELLIOT - "1000 Water Craters On The Sea" (GB)
12. HORUS CHAMBER - “Long Lankin (PT)
Horus Chamber no 1.º aniversário do Café Europa

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Café Europa: Emissão #58, de 11 de Fevereiro de 2013

1.ª Hora
01. THROBBING GRISTLE - "Industrial Introduction" (GB)
02. THROBBING GRISTLE - "United" (GB)
03. THROBBING GRISTLE - "Convincing People" (GB)
04. X-TG - "Stasis" (GB)
05. X-TG - "E.H.S." (GB)
06. X-TG - "Breach" (GB)
07. X-TG - "Um Dum Dom" (GB)
08. X-TG - "Trope" (GB)
09. THROBBING GRISTLE - "Almost a Kiss" (GB)
10. COIL - "All The Heart Of It All" (GB)
11. COIL - "The Dreamer Is Still Asleep" (GB)

2.ª Hora
01. PSYCHIC TV - "Je T’Aime, Moi Non Plus" (GB)
02. PSYCHIC TV - "Abstract Reality" (GB)
03. X-TG - "What He Said" (GB)
04. X-TG - "In Accord" (GB)
05. THE THRESHOLD HOUSEBOYS CHOIR - "As Doors Open Into Space” (GB)
06. THE THRESHOLD HOUSEBOYS CHOIR - "A Time Of Happening” (GB)
07. X-TG - "Gordian Knot" (GB)
08. X-TG - "Emerge To Space Jazz" (GB)
09. X-TG - "The End" (GB)
10. SIEBEN - "Sacrifice Content (Krypta Remix)" (GB)
11. TONY WAKEFORD - "Night Forever" (GB)
12. ORCHESTRA NOIR - "Bedlam" (GB)
13. ANDREW KING- "Sic Mea Fata Canendo Solor" (GB

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Café Europa apresenta: X-TG "Desertshore / The Final Report" part.II


X-TG "The Final Report"
Industrial Records, 2012
Na passada semana tivemos aqui a análise dos valores e inconsistências dos temas presentes em “Desertshore by X-TG”, no qual os dois elementos sobreviventes Chris Carter e Cosey Fanni Tutti, recuperavam as sessões gravadas até 2010, com o falecido Peter Christopherson, para os originais de Nico incluídos no seu velho clássico de 1970 com o mesmo título. Se, para esse verdadeiro tributo de amor à memória de Christopherson, contaram com a colaboração de gente famosa como Marc Almond,  Antony ou Blixa Bargeld, no disco que completa a supostamente derradeira edição de estúdio das pessoas em tempos ligadas aos Throbbing Gristle, “The Final Report”, Chris e  Cosey repõem parte das gravações originais antes da morte de ‘Sleazy’ assim como alguns acrescentos realizados já postumamente.                                                                                          
Vimos que, na primeira parte desta edição de luxo de Novembro passado, se verificava algum equilíbrio entre momentos altos e baixos, embora o seu alinhamento no álbum fizesse temer o pior, quiçá uma obra falhada, o que felizmente não veio a acontecer. Ao fim de uma audição algo preocupada, chegou-se à conclusão de que se salvava não só alma do disco, como o cômputo geral das suas qualidades, a começar por uma produção e mistura irrepreensíveis. “Desertshore by X-TG” abria assim, suavemente, o caminho para o relatório final da lenda T.G.
A sonoridade adaptada de alguns dos momentos de “Desertshore” apontava, curiosamente, para a repescagem de sons de há mais de trinta anos, concretamente semelhantes aos que figuravam em “20 Jazz Funk Greats” e “Heathen Earth”. É com esse fio condutor que se restabelece o contacto em “The Final Report”.
Começando com “Stasis”, os X-TG constroem um tema de quase sete minutos que define as intenções de uma obra que pretende encerrar quase solenemente uma carreira de 37 anos. De um resíduo ambiental crescente, nasce uma rítmica marcha tribal industrial, polvilhada com drones reverberados que motivam resposta automática da nossa memória em relação a coisas como Deutsch Nepal, com a mesma gramática abstrata e a mesma tensão hipnótica presente em álbuns dos supra citados suecos como “Benevolence” e “Erosion”, não fosse a velha trompete de Cosey Fanni Tutti a marcar com propriedade a tradicional griffe dos Throbbing Gristle. Para introdução não se poderia pedir melhor a um colectivo reduzido de veteranos, e na sequência, “E.H.S.”, resulta numa abordagem ainda mais fiel ao dark-ambient industrial de antanho, acrescido de vocoders imperceptíveis, combinados com uma guitarra distorcida que se lamenta em avisos sucessivos, alertas subliminares que atestam a patente de que os T.G. sempre usaram os instrumentos ditos normais de uma forma subversiva / subversora.
 “Breach” e “Um Dum Dom” parecem enquadrar-se um pouco mais em território partilhado com as entidades que evoluíram dos velhos T.G., quer sejam os Coil ou Chris and Cosey, embora com predomínio da estética de Christopherson, por exemplo com os Threshold Houseboys Choir/Soisong. Há uma melódica que vai planando entre baixos e ritmos obsessivos que culminam num tic-tac de relógio de sala que faz a ponte com “Um Dum Dom”, um chachachá à maneira dos Cabaret Voltaire, recheado com um registo de teclas entre o vibrafone e o gamelan, piscadela de olho ao estatuto de cidadão tailandês entretanto granjeado por ‘Sleazy’. Digamos que este divertido intermezzo marca a passagem para uma nova dimensão deste derradeiro relatório X-TG.
“Trope” é uma peça distópica e angustiante, latejante como uma enxaqueca de lucidez no início de uma grande jornada. Assente num maquinal loop industrial, cheio de rangeres de engrenagens mal lubrificadas, ressurge o registo vocal quase kraftwerkiano, ainda assim pouco presente, ao contrário dos tempos em que Genesis P. Orridge empregava a sua glossolalia lisérgica. Como constataremos adiante, será mesmo que com este tema “Trope” que o álbum “The Final Report” se desdobra, como se de outro álbum mutante nascesse, como um rebento excrescente pouco bonito de se ver mas mesmo assim fascinante. A atmosfera opressora parece de novo ganhar forma como em 77, como no iniciático “2nd Annual Report”.  Se tentássemos estabelecer paralelos com os temas mais duros dos registos recentes de 2007 e 2009, “Part 2 The Endless Knot” e “3rd Mind Movements”, “Trope”, mesmo assim, conseguiriam batê-los aos pontos, em matéria de retro-actividade. Aliás, será este um dos pontos mais enigmáticos na análise do trabalho destes músicos, no momento de dizer “Adeus” – os iconoclastas proscritos que há três décadas e meia foram alvo de uma guerra santa proclamada pelos conservadores, que os consideraram destruidores da Civilização, fazem hoje música que está deveras nos limites mas é aceite consensual e condignamente como vanguardista, como válida no actual contexto da Humanidade. Quer isto dizer que já poucos ficarão chocados com as suas arrojadas visões sonoras sobre presente e futuro da sociedade, quer isto dizer que já nos habituámos todos ao cinzento de “1984” e ao cheiro nauseabundo que emana das sarjetas da sociedade liberal de controlo em que nos movemos. Quer isto também dizer que o presente foi ao encontro do passado e das palavras de Genesis P. Orridge, escritas no panfleto que anunciava a primeira actuação do grupo, em Julho de 1976 , e que passamos a ler – “(…) Imagine-se andar por ruas enevoadas, caóticas. Pós-civilização. Cães vadios comendo lixo, vento a uivar (…) Estamos em 1984. A única realidade é a espera. Mortal. É a sociedade da fábrica da morte, hipnótica, mecânica, esmagadora. Música da desesperança. Banda sonora para cobrir o holocausto. Tantra do subliminal, queda da palavra, queda das imagens. A tribo das mutações, bandos de rua lobotomizados na fábrica da morte. Sem fim. Crianças da Televisão tentam preparar-se, meditando no cessar da existência. (…) Chegou a Música para 1984.”. Ora, em 2013, quem não reconhecer nisto um pouco da sua realidade circundante, é porque de facto cessou de existir.
E, doravante, no alinhamento de “The Final Report”, é constante o sofisticado terror sónico – “What He Said” e “In Accord” asseguram essa qualidade única de construir narrativas abstratas, que aparentam fazer perfeito sentido, mas cujo significado não conseguimos esclarecer, embora esta última até tenha uma heartbeat quase funky, e feche com uma espécie de solilóquio de pequeno extraterrestre cinzento!
Os momentos finais do relatório final aproximam-se – a sala ainda não está vazia, mas já houve gente, menos dada a estas coisas do coração, que os abandonou … com um olhar indiferente perante todas as suas acrobacias e proezas, perante a sua inegável meia-idade, avançada e resistente, um pouco heroica, até. Cada um dos elementos do casal Carter Tutti já ultrapassou os 60 anos de idade, e as novas gerações nunca se dignam entender o significado do verbo envelhecer- ainda não está na sua programação biopsicológica. Por seu turno, os X-TG sabem-no bem, ou não fossem eles co-autores da tetralogia que medeia entre “2nd Annual Report” e “Heathen Earth”, uma pequena-grande revolução de traços escatológicos contra a sociedade de controlo, regra geral dirigida pelos que já ganharam a dita experiência de vida. A sala ainda não está vazia – com eles ainda estão os que sempre neles viram forças de orientação e criatividade únicas e com eles vão ficar até ao fim. Os últimos temas sucedem-se com a mesma dinâmica avassaladora e qualidade impecável – “Gordian Knot” e “Emerge to Space Jazz” (talvez com ecos da velada profissão de fé que ‘Sleazy’ sempre prestou a Sun Ra), dois momentos que ainda elevam mais alta a fasquia da qualidade deste último trabalho dos Throbbing Gristle sem Genesis P. Orridge e sem a presença física, à altura do seu lançamento, de Peter Christopherson, embora presente na maior parte das gravações. Incautos, os que vão ficando, ignoram que serão eles a quem a máquina irá ser desligada, não à banda. Serão eles mesmos, caso não souberem libertar-se duma estética, ela própria libertária, que lhes revelou a liberdade dos sons há tantos anos atrás. Último tema, último minuto e meio – parece Ringo a falar dos últimos takes de “Abbey Road” - e regressa o mesmo latejar de subgraves, o mesmo raspar de chapas e fios elétricos descarnados, a mesma visão de pacífico estertor que Kubrick concebeu para a morte de Hal, o computador central da nave de 2001 Odisseia no Espaço. Os sons digitais morrem hipoteticamente no espaço da nossa sala, que já não é a sala onde ainda há pouco os X-TG faziam o simulacro de um grande incêndio final. Parece finalmente haver paz. O silêncio sem os Throbbing Gristle é igual a qualquer outro silêncio já ouvido. Será isso significativo? Terá a missão terminado? Quem os lembrará?
Há 35 anos numa pequena cidade, um adolescente na secção de revistas de uma grande distribuidora livreira, hesitava folhear entre duas revistas – uma, inglesa de título em espanhol, sobre, digamos, atividades naturistas dentro de portas, com modelos de todo o mundo, entre os quais de Inglaterra, e a outra uma conceituada revista europeia sobre música jovem, herdeira do espírito libertário do maio parisiense. Optando pela segunda, o teenager descobriria para seu espanto e regalo, uma reportagem dissecadora, escrita pelo distinto jornalista francês Yves Adrien, sobre a nascente música industrial britânica – de Sheffield, uns tais Cabaret Voltaire e Human League lideravam as sondagens; de Londres, um estranho grupo de outsiders era alvo da mais intensa e perturbante descrição jornalística, como se da mais importante revelação se tratasse, para o futuro da música numa sociedade mecanizada. Ignorava o jovem leitor que na outra publicação poderia bem encontrar alguma referência a alguns dos elementos desse grupo. Davam pelo nome de Throbbing Gristle, expressão de rua da região de Yorkshire, para um fenómeno natural na anatomia humana, ligado à circulação sanguínea. Fim do último relatório anual. 
Texto: JCS
Fotos: AF

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Café Europa: Emissão #57, de 04 de Fevereiro de 2013

1.ª Hora
01. THE JOY OF NATURE - "O Sopro do Vento Norte" (PT)
02. THE JOY OF NATURE - "Da Terra" (PT)
03. THE JOY OF NATURE - "Ainda Há Dias Em Que Se Vêem Ilhas Encantadas" (PT)
04. HULDUEFNI - "Paranoia (inside my mind)" (PT)
05. THERMIDOR - "Outro ‘Ancoradouro’" (PT)
06. TROBBING GRISTLE - "Pré gravações para “Desertshore" (GB)
07. NICO / X-TG (vocals by Antony) - "Janitor Of Lunacy" (GB)
08. NICO / X-TG (vocals by Blixa Bargeld) - "Abschied" (GB)
09. NICO / X-TG (vocals by Sasha Grey) - "Afraid" (GB)
10. NICO / X-TG (vocals by Marc Almond) - "The Falconer" (GB)

2.ª Hora
01. NICO / X-TG (vocals by Cosey Fanni Tutti) - "All That Is My Own" (GB)
02. NICO / X-TG (vocals by Blixa Bargeld) - "Mütterlein" (GB)
03. NICO / X-TG (vocals by Gaspar Noé) - "Le Petit Chevalier" (GB)
04. NICO / X-TG (vocals by Cosey Fanni Tutti) - "My Only Child" (GB)
05. NICO / X-TG (vocals by various artists) - "Desertshores" (GB)
06. REIGNS - "Corners & The Straights" (GB)
07. TERRY RILEY - "In The Summer" (USA)
08. SCOTT WALKER - "Corps De Blah" (USA-GB)
09. AMBIENCE - "Conflito" (PT)
Peter Christopherson

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Café Europa apresenta: X-TG "Desertshore / The Final Report" part.I


X-TG "Desertshore" 
Industrial Records, 2012
Assistir à demolição de dois edifícios – como já tivemos a oportunidade de ver, globalmente e em tempo real – pode ser um dos eventos mais traumáticos da nossa existência. Tanto maior será o trauma se soubermos que com a derrocada do betão, vidas inocentes são sacrificadas. Dizem uns, em nome de um deus menor, outros, em nome do dinheiro. Feita a transposição mental para o objecto desta prosa para a emissão desta noite no CE, será necessário manter o sangue-frio e afastados os vapores inebriantes do fascismo emocional que regra geral condimenta parti-pris e tomadas de consciência mais ou menos preconceituosas. “Desert Shore – The  Final Report” não é um disco dos Throbbing Gristle, embora tenha sido, em tempos relativamente recentes, uma hipótese com a velha formação que revolucionou o mundo da música moderna. É uma obra de colectivo para homenagear o falecido companheiro Peter ‘Sleazy’ Christopherson, que cessou de existir biologicamente em 25 de Novembro de 2010, mas cuja obra permanece intacta como tesouro inesgotável de maravilhas sonoras, com os Coil, com os Soi Song , com o Threshold Houseboys Choir, ou nos primeiros discos dos Psychic TV de Genesis P Orridge e, acima de tudo, com a lendária tetralogia de estúdio dos Throbbing Gristle entre 1977 e 81. Sleazy morreu, e tudo mudou depois.
Nesse estranho mês de novembro de 2010, a hipótese de ver os TG com a equipa original no nosso país foi de repente quebrada pela reprise de um velho amoque entre Genesis e o casal Chris Carter/ Cosey Fanni Tutti. Em 2007, aquando do lançamento do fantástico disco de regresso “Part 2 The Endless Knot”, perspectivava-se uma nova idade de ouro para antigos e novos aficionados do universo TG – a força plástica desse disco não foi infelizmente devidamente prosseguida. No entanto, preparava-se entre Sleazy e Genesis P.O. um projecto que poderia ainda salvar uma reputação basilar – enquanto ultimavam todos o sucessor de Thee endless knot, que se chamaria The Third mind movements , nascia a ideia de recrear “Desertshore” na sua totalidade, o álbum-referência de Nico, e um dos unanimemente favoritos dos T.G. Na digressão que apresentou “3rd Mind Movements”, já de si um trabalho algo diferente, menos contemporâneo e mais oldschool do que “The Endless Knot” tinha sido, a chamada “Desertshore installation” tomava forma, aparecendo inclusive na edição limitada vinil do seu álbum-gémeo.

Mas, como dissemos, tudo acabou com mais um arrufo e uma morte. No final do ano passado, os sobreviventes desses inverosímeis X-TG, decidiram que o material realizado era demasiado poderoso e valioso para se deixar morrer na prateleira. Chamou-se Antony, chamou-se Marc Almond, também a atriz Sasha Grey, que atrás já trabalhara para David Tibet e C93, assim como o amigo berlinense Blixa Bargeld e outros como Gaspar Noé, e vai de usar e retrabalhar as pistas deixadas por Sleazy e Génesis P.O., com um acabamento de construção impecável, para relembrar bem alto o génio de Peter Christopherson. Nada de errado e nada de mau até ao momento. Chris and Cosey deverão ter o aval distante de Génesis P.O. para poderem concretizar tal projecto, até porque se trata de um duplo álbum, sendo o segundo as derradeiras gravações dos tais X-TG, empacotadas aqui como “The Final Report”, repescando a gramática que marcou o início do grupo em 75, com as confusões entre 1st e 2nd Anual Report, já para não falar nas velhas K7’s de “Best Of”, em que o volume 2 foi divulgado ao mundo antes do primeiro, tal como nos álbuns. Em 81, quando o grupo actuou pela última vez na Califórnia, dando azo ao lançamento de “Mission of Dead Souls”, também tinham prometido que a missão terminara, mas em 82 a Industrial Records ainda lançou “Journey Through a Body”, um álbum inteiro de inéditos…
Portanto, com os TG ou os ex-TG, nunca se sabe quando imperará o silêncio definitivo. Assim que se ouve a voz de Antony, nos seus maneirismos já gastos, logo a abrir na versão de “Janitor of Lunacy”, receia-se o pior dos bocejos, ou pior ainda, o ataque de desinteresse auditivo que, regra geral, por muito que se teime, nunca nos deixa escutar uma obra imparcialmente até ao fim. Enquanto aquela coisa meio-falsete, meio-ganido entre Bryan Ferry e Nina Simone serpenteia entre as pistas impecavelmente operadas pelos anfitriões, lembramo-nos da prestação fria e hipnótica de Genesis P. Orridge e conclui-se que o segredo da magia nunca esteve na perfeição técnica da entrega, antes na rudeza brutal ou imperfeição impoluta do momento e atitudes criativos. Passado que está Antony a tornar um clássico num momento olvidável, temos Blixa Bargeld a atrapalhar “Abschied” – e nesta altura, os cold-feet do embaraço atacam o ouvinte. À segunda, ainda não bateu! Estará o conceito deste disco totalmente errado? Como se não bastasse, entra a insigne actriz Sasha Grey que vai oralizar um interessante mise-en-scène sonoro de Afraid – caramba! Uma das canções que fez de “Desertshore” uma coisa religiosa! – e redescobre-se o potencial sonífero de fortes recortes hipnóticos de uma abordagem semi-dub, sem dúvida um piscar de olho pouco convidativo ao velho conceito T.G. de ZyklonBzombie. Aqui, o escriba tem vontade de parar a leitura do CD. Respira fundo e olha para o listing – parece tranquilizar-se um pouco, em função de uma réstia de esperança, já que na continuidade de convidados de honra, segue-se o nome de Marc Almond, cobrindo “The Falconer”. Questiona-se em pensamento, “Será desta?”…
A sedução espiritual induzida em modo sagrado pela voz de Marc Almond tem sido o seu principal argumento, aliado à escolha criteriosa de poetas malditos e compositores proscritos que tem seguido, para consagrar um estilo inimitável de cantar. Se Scott Walker lhe foi em tempos role-model, agora o contrário podia bem ser verdade, sem prejuízo para o autor septuagenário do mirabolante “Bish Bosh”. “The Falconer” é exactamente onde a recriação de “Desertshore”, insufla fortemente para reatear as brasas moribundas na lareira da memória, numa cover que pela primeira vez parece pensar na homenagem sentida a Peter ‘Sleazy’ Christopherson. Acto contínuo, Cosey Fanni Tutti ataca “All That Is My Own” com aquela suavidade gélida com que sempre permeou os registos de CTI e Chris and Cosey e para a teatralidade teutónica industrial de “Mutterlein” reaparece Blixa – desta vez, talvez pelo alento gerado pelas duas últimas covers, até parece que o velho demolidor de prédios novos (sem piada à metáfora que iniciou este relatório) é um convincente contador de histórias. De resto, a expressão da base musical para a versão parece saída de “Heathen Earth”, o que é também um pensamento reconfortante.
Se bem repararam, até ao momento temos estado a fundamentar a nossa visão e audição deste tributo conjunto a Peter Christopherson e a Nico, com base no casamento entre a vocalização das estrelas convidadas e as instrumentações propriamente ditas dos X-TG, pesando bem o efeito de aglutinação e simbiose gerado. Há, no entanto, que sublinhar o esforço atento da produção do casal Carter/Tutti, talvez o aspecto mais forte de todo este pacote de emoções anunciadas, uma aprumo digital impecável e acima de tudo indiciador da mestria da mistura, ideias que decerto terão nascido com o projecto quando ‘Sleazy’ ainda estava vivo. Com seis temas decorridos, o equilíbrio entre o insípido e o interessante não faz justiça ao empenho profissional e emocional evidenciados, e não tenhamos ilusões porque, pelo menos até ao final desta primeira metade do duplo álbum X-TG “Desertshore/The Final Report” as coisas não vão mudar. Gaspar Noé nada adianta em “Le Petit Chevalier”, que no original era interpretado pelo pequeno Ari Boulogne, filho da relação entre Nico e Alain Delon, a não ser uma versão altamente mecanizada, onde se reconhecem sons industriais de há trinta e tal anos – ao menos isso! – de resto a vocalização é a pior de todo o álbum, até mais enfadonha que a de Antony, mesmo que os efeitos cyborg procurem disfarçar a aridez inexpressiva da prestação vocal de Noé. Repetindo o padrão, lá vem um momento mais inspirado – de novo com a patroa Cosey Fanni Tutti, “My Only Child” é, talvez, com a cover de “The Falconer”, assumida por Marc Almond, o grande momento deste “Desertshore” reinterpretado pelos ex-TG. Segue-se uma melopeia conjunta, com efeitos e leituras algo indecifráveis, atribuída às “Desertshore Voices”, que incluem Chris Connelly, Bee, Tibet, Drew McDowell, Daniel Miller, Stephen Thrower, entre outros dos que colaboraram e trabalharam a sério em vida com ‘Sleazy’, para além dos anfitriões da homenagem, só para citar os mais meritoriamente conhecidos, numa imagem sónica de bons augúrios para a prossecução de glória de um Artista tão grande com a vida ela própria, de um homem que, oriundo da aristocracia britânica, optou por seguir o seu próprio caminho de risco, navegando sempre com a segurança de uma vela na tempestade, entre as gigantes ondas do preconceito, da irremediável tacanhez, da corrupção, da estupidez disfarçada de pragmatismo, e da inveja. A propósito deste tema, por momentos, e se não fosse a lista não incluir o nome do também malogrado Jhonn Balance, estaríamos tentados a jurar a pés juntos que, ou se trata de alucinação auditiva, ou vontade dos autores em não o revelar, mas, entre todas as vozes que de Peter Christopherson se despedem, aos 2m29s, há uma voz muito familiar que diz qualquer coisa como “he who knows me may pass on beyond, and meet me on a desert shore”.
Em suma, um disco de qualidade, cujos elevados propósitos humanos justificam, à priori, uma dedicação incondicional, uma audição atenta, repetidas quantas vezes necessárias, para digerir uma ou outra incongruência e, a meio de um percurso para o fim do qual falta ainda ouvir o disco que encerra a história conhecida dos Throbbing Gristle, ter fé que o adeus final possa só ser um êxtase e não uma agonia. 
Peter Martin Christopherson, o filho de Lady Frances Tearle Christopherson e de Sir Derman Christopherson, reitor do Magdalene College, de Cambridge, ‘Sleazy’ Christopherson como mundialmente se tornou famoso pela capas que ajudou a conceber para grupos como os Pink Floyd, Genesis e Peter Gabriel, ou ainda os Van der Graaf Generator, entre muitos outros clientes da Hipgnosis, pelos vídeos que realizou profissionalmente para a então emergente MTV, criando um paradigma de revolução estética num negócio de milhões, pela objectiva crua e dura que impôs à fotografia no último quartel do século XX, mas sobretudo pela música e sons que criou ao longo de 35 anos, merecerá e muito este e todos os outros tributos que possam acontecer no futuro.
O afastamento de Genesis P. Orridge dos TG e X-TG nada tem a ver com isto, nunca foi motivado por desavenças com ‘Sleazy’. Numa unidade criativa chega sempre o dia em que cada um vai à sua vida; se aconteceu com os Beatles, ainda não aconteceu com os Stones, se ainda não aconteceu com os Laibach, lamenta-se com pesar que a missão dos Throbbing Gristle tenha terminado…uma vez mais.

Na próxima semana no Café Europa, The Final Report by X-TG.